
O nosso trabalho é cerebral e sem fim. Portanto, a nossa atividade é estudar e aprofundar o conhecimento em busca de um grau de Esclarecimento cada vez maior. Isso exige tempo, dedicação, leitura, releitura de livros e comentadores e mesmo a leitura e a releitura do mesmo livro e texto por diversos tipos de vieses, exige pesquisa, busca por artigos e textos seguros e sérios entre as miríades de lixos que pululam a internet e as redes sociais. Por isso, segue abaixo, mais um fruto de nosso trabalho de busca por informação e conhecimento e que compartilhamos com quem tem responsabilidade para com o Conhecimento e que leva os Estudos à sério e não apenas busca decorar e meramente se informar para conseguir uma mísera nota numa prova de uma disciplina qualquer. Reitero ainda que a leitura desse livro de Darcy Ribeiro, Maíra, é indispensável para uma compreensão maior dos assuntos tratados na obra ficcional de um antropólogo por essência que buscou unir filosofia, literatura e antropologia. Aproveitem! Bons estudos!
_____Emerson
Maíra, de Darcy Ribeiro:
gozo, dor e morte do índio
Aloisio Andrade Oliveira
O autor e a obra
Darcy Ribeiro, antropólogo, educador e romancista, nasceu em Montes Claros (MG), em 26 de outubro de 1922, e faleceu em Brasília, DF, em 17 de fevereiro de 1997. Diplomou-se em Ciências Sociais pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo (1946), com especialização em Antropologia. Etnólogo
do Serviço de Proteção aos Índios, dedicou os primeiros anos de vida
profissional (1947-56) ao estudo dos índios de várias tribos do país.
Fundou o Museu do Índio, que dirigiu até 1947, e colaborou na criação do
Parque Indígena do Xingu. Escreveu uma vasta obra etnográfica e de
defesa da causa indígena. Elaborou para a UNESCO um estudo do impacto da
civilização sobre os grupos indígenas brasileiros no século XX e
colaborou com a Organização Internacional do Trabalho na preparação de
um manual sobre os povos aborígenes de todo o mundo. Organizou e dirigiu
o primeiro curso de pós-graduação em Antropologia, e foi professor de
Etnologia da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil
(1955-56).
Diretor
de Estudos Sociais do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais do
MEC (1957-61); presidente da Associação Brasileira de Antropologia.
Participou com Anísio Teixeira, da defesa da escola pública por ocasião
da discussão de Lei de Diretrizes e Bases da Educação; criou a
Universidade de Brasília, de que foi o primeiro reitor; foi ministro da
Educação e chefe da Casa Civil do Governo João Goulart. Com o golpe
militar de 64, teve os direitos políticos cassados e se exilou.
Viveu em vários países da América Latina, conduzindo programas de reforma universitária, com base nas idéias que defendeu em A Universidade
necessária. Professor de Antropologia da Universidade Oriental do
Uruguai; foi assessor do presidente Salvador Allende, no Chile, e de
Velasco Alvarado, no Peru. Escreveu nesse período os cinco volumes dos
estudos de Antropologia da Civilização (O processo civilizatório, As
Américas e a civilização, O dilema da América Latina, Os brasileiros -
1. Teoria do Brasil e Os índios e a civilização), nos quais propõe uma
teoria explicativa das causas do desenvolvimento desigual dos povos
americanos.
Em Confissões,
sua autobiografia, Darcy Ribeiro diz que inicialmente estudava os
índios como um objeto externo que se olhava de fora, tanto para entender
a natureza humana quanto para tanta compreender uma das matrizes
formadoras da sociedade brasileira. No entanto, diz que começou a vê-los
como “gente humana, adaptando-se penosamente aos novos tempos para
sobreviver tal qual é ou era”. E acrescenta:
“Assim
foi que aprendi a olhar os índios com os olhos deles mesmos. A partir
de então, caí num questionamento de mim mesmo como antropólogo.
Primeiro, pela crítica da etnologia aparentemente científica e inocente
que cultivara até então, estudando parentescos ou mitologias ou
colecionando artefatos, num total descaso pelo trágico destino dos
índios que contavam os contos ou faziam os artefatos”.
Na
autobiografia, Darcy Ribeiro refere-se ainda à solidão do exílio e à
maneira que encontrou para combatê-la, utilizando suas vivências nas
aldeias indígenas para compor ficção. O autor é profundamente passional
ao mencionar seu romance Maíra:
“Nunca
escrevi nada com tanta emoção, mesmo porque meu tema ali era dar
expressão ao que aprendi, no longo convívio com os índios, sobre a dor
de ser índio, mas também sobre a glória e o gozo de ser índio. Enquanto
eu o escrevi, eu estava lá na aldeia com eles. Era, outra vez, um jovem
etnólogo, aprendendo a ver seu povo e a ver o meu mundo com os olhos
deles”.
O subtítulo de Maíra,
“Um romance dos índios e da Amazônia”, revela a maneira poética como a
vida indígena será abordada e a denúncia que será feita contra a
devastação tanto de sua cultura quanto da floresta. Segundo o autor, há
uma vontade de perfeição e beleza nas atitudes dos índios, porque é
através delas que eles se retratam.
Na Introdução
da obra, o autor admite o caráter ficcional da narrativa e sugere
inclusive um teor pedagógico, ao considerá-la uma “reconstituição
literária da etnologia indígena”. Justifica também a unificação das
culturas indígenas dentro do romance através da tribo mairum, uma
sociedade indígena ficcional, dizendo que a cultura não é apreensível se
dissociada da mitologia, da arte, da religião; por isso optou-se por
misturar as lendas, os mitos, os contos dos índios, de modo a gerar o
contraste entre sua cosmogonia — a perspectiva indígena sobre a criação
do universo — e a “visão cristã de mundo”.
Missa
O romance Maíra
é construído com base na estrutura da missa católica tradicional. A
missa tem um sentido estritamente sacrificial, o que aponta para a
temática principal do livro: a morte. Essa morte se dará em vários
sentidos, no entanto, o mais proeminente é o extermínio da cultura
indígena, em contato com a sociedade civilizada. A morte da cultura
indígena será retratada tanto no plano social, na abordagem do fim
gradual da tribo dos mairuns, quanto no plano individual, através da
história do índio Avá, que recebe o nome de Isaías quando resolve se
tornar um sacerdote.
Isaías
representa o índio convertido e civilizado, que almeja se tornar padre
para catequizar os mairuns, mas que acaba negando a vocação de sacerdote
para voltar à tribo. Ao desistir da vida religiosa, Isaías encarna o
violento processo de transfiguração étnica, ou seja, da transformação de
sua identidade indígena, a partir do contato com a civilização, e da
impossibilidade de resgatar sua cultura original. Seu conflito espelhará
a morte simbólica dos índios, quando perdem suas características
étnicas, conflitantes com as dos brancos.
A
morte liga-se também à figura da personagem Alma. Depois de mais de
dois anos de convívio com os índios mairuns, ela e dois gêmeos de quem
estava grávida são encontrados mortos às margens do rio Iparanã, próximo
à aldeia. A simbologia de sua morte será analisada mais adiante.
O
romance se inicia com a “Antífona”, que é a parte da missa em que se
entoam os cânticos, antes dos salmos. É a parte destinada a preparar o
homem para o sacrifício de Cristo que virá a seguir. São os ritos
iniciais, os cantos de abertura. A “Antífona” em Maíra
corresponde à narração das principais mortes que conduzirão a narrativa:
a de Alma, a do tuxaua Anacã, e a morte simbólica de Isaías.
Em
seguida, a “Homilia”, que são os ritos da palavra. É o momento em que o
sacerdote, como o representante de Deus na terra, profere os sermões,
as pregações, os evangelhos, as interpretações e explicações dos textos
bíblicos. Em Maíra, corresponderá à parte em que serão narrados
os mitos indígenas da criação dos deuses e do mundo — é a “palavra
sagrada” dos mairuns.
O
romance segue com o “Canon”, os ritos sacramentais das oferendas e da
comunhão. É o ponto alto da celebração da missa, quando se presentifica o
sacrifício de Cristo e a salvação do homem, quando se rememoram os
acontecimentos da paixão, morte e ressurreição de Jesus. A comunhão, na
obra, será representada pela entrada dos deuses mairuns nos corpos das
personagens. Em alguns desses capítulos, as vozes dos planos sagrado e
terreno irão se misturar.
Para
finalizar, o “Corpus”, os cantos de ação de graças e as bênçãos finais.
No ritual católico, é o momento de refletir sobre a palavra de Deus e
de aceitar a missão de difundi-la. Na narrativa, indica o alerta contra a
morte da cultura indígena como aspecto que deve ser anunciado ao mundo.
Portanto,
como a missa católica celebra a morte, mas também a ressurreição, e o
romance anuncia principalmente o extermínio dos índios, pode-se afirmar
que ocorre um processo intertextual de paródia. Desconstrói-se a idéia
da salvação e enfatiza-se o fim dos mitos, da cultura, dos ritos e da
sociedade indígena, metonimizados através da tribo dos mairuns.
Trata-se, enfim, de uma missa católica sobre um povo pagão. O conflito
existencial pelo qual passará Isaías se tornará então um dos focos do
romance, pois espelhará o choque brutal de duas identidades culturais
antagônicas.
Polifonia
Maíra
é narrado de maneira polifônica, ou seja, com a presença de várias
vozes narrativas, que muitas vezes são dissonantes e que ilustram, no
universo literário, o conflito entre as culturas existente no Brasil.
Há
a presença de uma voz narrativa onisciente, que conhece os
acontecimentos, que narra a vida dos índios e dos brancos. Do mundo
mairum e do mundo civilizado, surgem vozes narrativas em 1ª pessoa.
Os
narradores do mundo civilizado valem-se muitas vezes de termos
burocráticos, de uma linguagem mais formal, de um objetivismo, através
de cartas, documentos jurídicos e processuais, por exemplo. Já do mundo
mairum eclodem vozes que usam a 1ª pessoa do plural, o que faz perceber o
contraste entre o individualismo dos brancos e o coletivismo dos
índios.
Junto
a esses narradores, tem-se a presença das vozes dos deuses mairuns, que
se manifestam quando incorporam as personagens, configurando uma
comunhão carnal e espiritual.
No
capítulo “Egosum”, que será tratado adiante, o autor ficcionaliza sua
própria voz, e a coloca acima até do narrador onisciente, pois,
momentaneamente, rompe com o pacto narrativo e revela de onde vieram
suas inspirações para as personagens.
O
livro se encerra com o “Indez”, um capítulo onde várias vozes se cruzam
caoticamente. Percebem-se os interesses de alguns personagens, como o
do Senador Andorinha, que manda expulsar os índios de suas terras para a
agropecuária, e a voz de Jaguar, índio mairum, saudoso de sua amante
branca Alma, mas desejo de sua amada mairum Inimá. Segundo o dicionário
Houaiss, “indez”, ou “endez”, é uma espécie de ovo que
se deixa no ninho descoberto, como chamariz para outras galinhas virem
fazer postura no local. Mas também possui o sentido figurado de
empecilho, de algo que prejudica ou aborrece.
O
ovo, no caso, é algo não fecundado, falso. Mas também é algo que
incomoda. Pode-se fazer uma associação com a morte gradual da cultura
indígena, que aos poucos se torna também infecunda, e que,
pejorativamente, acaba por se tornar um estorvo para os brancos. Ou
ainda aos filhos que Alma perderá, que são sementes estéreis, que não
germinarão. Mas o sentido de chamariz liga-se igualmente ao alerta feito
pela obra quanto ao extermínio gradual dos índios.
Esse
conflito liga-se ao multiculturalismo presente no país, que
inicialmente pode ser identificado como um pluralismo cultural. O
multiculturalismo indica que “determinadas culturas, postas em relação
aberta e ativa, afetam-se e modificam-se em um processo transitivo de
complexas mutações das quais surgem novas realidades culturais”.
Contudo, essa diversidade cultural e essas novas realidades nem sempre
ocorrem de maneira harmônica. Ironicamente, apesar de tantas vozes
narrativas no corpo do texto, a obra aborda precisamente o silenciamento da cultura indígena pelo homem civilizado.
O mundo mairum
O mundo mairum pode ser entendido através
dos personagens principais que o compõem e de sua organização social
peculiar, através dos seus rituais e de seus mitos de criação.
1) PERSONAGENS E ORGANIZAÇÃO SOCIAL
Anacã é o tuxaua, o chefe indígena, o cacique ou chefe guerreiro, uma espécie de líder político:
“No
vasto mundo dos poucos mairuns viventes e dos muitos que viveram e
morreram, corre a notícia. O tuxaua Anacã decidiu que nesta noite dos
vivos ele deitará para dormir, como sempre, mas só acordará de
madrugada, morto-vivo, no fim do dia dos mortos, para ver a luz do sol
negro iluminando”. (p.38)
Depois
da morte do tuxaua, para celebrar a renovação da vida, ocorrerão vários
rituais. Seu corpo será enterrado no meio do pátio de danças, e toda
tarde será regado com água, para que suas carnes amoleçam e se misturem
ao barro. O cheiro do corpo se espalhará por toda a aldeia mairum:
“As
rajadas de vento não lavam o ar, apenas revolvem a catinga e a devolvem
concentrada. Nunca Anacã, o tuxaua, esteve tão presente e
dominador”.(p.67)
“Anacã
morre para que os mairuns renasçam. Simultaneamente se vão dissolvendo
na morte suas carnes regadas cada dia e renascendo seu povo nos ritos
que reacendem em cada um o gosto de comer, a alegria de cantar, o prazer
de dançar, a coragem de ousar, o gozo de foder”(p.99)
O
prestígio de Anacã advém de sua força política, pois havia
reestruturado a tribo mairum, juntando os clãs antes rivais e levando-os
todos para as matas próximas à Lagoa Negra. Sua morte e o ritual de seu
sepultamento definitivo marcarão o início e o final da primeira parte
do livro, a “Antífona”. Anacã deve se tornar Anacã-Manon, ou seja,
Anacã-defunto, e para tanto o aroe Remui, auxiliado por Jaguar,
descendente do tuxaua, e por Teró e Narú, descendentes do aroe, começam a
desenterrar seus ossos.
Todos
estão com seus cocares cerimoniais e com os corpos pintados e
adornados. Remui sopra a flauta e chacoalha o maracá num ritmo hipnótico
alternadamente forte e leve. Segue até a sepultura de Anacã e, com
profundo respeito, desfaz com as mãos o monte de lama que envolve as
carnes apodrecidas do antigo tuxaua. Em seguida dá os ossos a cada
mairum, que os vai lavar na lagoa até ficarem brancos. As mulheres e os
homens mais velhos escarificam a pele e choram o morto. O aroe diz
solene:
“—Anacã,
meu tuxaua Anacã, hoje é o dia de sua morte. Logo chegará sua hora
derradeira, Anacã. A hora de morrer definitivamente para nós. Sua festa
está acabando. Já dançamos todas as danças, exceto o Coraci-Iaci, você
sabe por quê. Já lutamos todas as lutas, inclusive o javari. Já comemos
muita carne. Já comemos muito peixe. Já bebemos muito cauim. Chegou,
afinal, Anacã, a sua hora”.(p.120)
Depois
de lavados, os ossos são cuidadosamente recobertos de penas coloridas
dos mais diversos pássaros e dispostos num cesto, que será dependurado
num grande mastro fincado no fundo da Lagoa dos mortos.
Remui
é o aroe, uma espécie de médium, guia místico, sacerdote, aquele que
conversa com os mortos, tem visões e recebe mensagens dos antepassados:
“Os
mortos entram e saem esvoaçando em círculos que sobem do baíto para o
alto do céu. Só são visíveis aos olhos do aroe, sentado no seu
banquinho-gavião de duas cabeças”. (p.37)
Teidju
é o oxim, um curandeiro, espécie de pajé, que possui certo prestígio
junto aos mairuns. No entanto, é um pouco desprezado e muitas vezes
ignorado, já que pode pedir por seu auxílio qualquer presente que
desejar, o que causa a ira de alguns mairuns.
Avá
é o tuxauarã, sobrinho de Anacã, o herdeiro da chefia de guerra dos
mairuns por via matrilinear. Trata-se de um índio que, quando criança,
adoeceu e foi levado até a missão religiosa que se instalou próxima à
aldeia. Lá toma contato com o cristianismo e resolve ser sacerdote.
Porém, muitos anos depois, já em Roma, próximo de se tornar padre, o
Avá, agora com o nome de Isaías, decide largar o sacerdócio para
reassumir sua identidade mairum, o que fará com que passe por um
processo de conflito de identidade, por se tratar de um índio civilizado
e cristianizado.
Jaguar é sobrinho de Avá/Isaías. Trata-se de um índio guerreiro, bravo e predestinado a também se tornar um tuxaua. Teró, amigo de Jaguar, é sobrinho de Remui, e seu destino é ser o futuro aroe.
A organização social da tribo mairum
é formada a partir da divisão da aldeia em metades casamenteiras e
repartidas nas casas de seus clãs. A estrutura de parentesco é mais
complexa do que a do homem branco. A aldeia, vista de cima, tem o
formato de uma roda de carroça. Os varais dos raios são os caminhos que
saem das casas em direção à casa-dos-homens, o baíto,
onde as redes são armadas de acordo com a ordem como as famílias
clânicas se plantam na aldeia. Essa é a definição que Isaías dá a ela:
“Uma
linha invisível parte a aldeia em duas metades, a do Nascente e a do
Poente. Cada uma delas com seus clãs que têm de ir buscar mulher ou
marido na banda oposta. Esta partição da aldeia em metades retrata no
chão a partição do mundo, tal como o concebemos, sempre dividido em
dois; o dia e a noite, o claro e o escuro, o sol e a lua, o fogo e a
água, o vermelho e o azul, e também o macho e a fêmea, o bom e o ruim, o
feio e o bonito. Uma banda da aldeia é do dia, da luz, do fogo, do
amarelo. (...) A outra banda é noturna, crepuscular, lunar, aquática,
azulona. (p.73)
No
início da obra, há o desenho da aldeia, em formato de roda de carroça
com a separação entre os clãs. A tribo é dividida de modo a que os
índios saibam onde devem buscar esposas ou maridos, conforme as regras
clânicas que visam impedir o incesto. Assim, há um diagrama que separa a
casa do jaguar da casa do carcará. O povo jaguar deve tomar como esposa
ou marido o povo carcará, e vice-versa. A mulher carcará dará à luz aos
futuros aroes, os guias espirituais, e as mulheres jaguar, os tuxauas,
os chefes guerreiros. Portanto, Anacã é tio do Avá, e o Avá é o tio de
Jaguar. Todos têm o direito, segundo a tradição mairum, de serem os
líderes mairuns.
2) RITUAIS
Durante
o sepultamento de Anacã, ocorrerão vários rituais fúnebres, que
demonstrarão a importância dos costumes indígenas e marcarão a “morte
gloriosa” de Anacã. São eles:
- Coraci-iaci:
depois de dançarem ao redor da cova de Anacã, os mairuns
preparam-se para a cauinagem. O cauim é uma espécie de aguardente
feita de milho torrado, mel e água. A dança solene do Jaguar, o
Coraci-iaci, a dança dos tuxauas, ainda não pode ser realizar, pois
um novo tuxaua não foi nomeado.
- Ñandeiara:
cada criança que fala recebe o nome de um seu ancestral nesse
ritual, junto com duas marcas de queimadura na maçã do rosto, a
marca do olhar de Maíra-Coraci, o Sol. É o coraci-mãa, a marca
solar dos mairuns. Assim, os ancestrais esquecidos sobreviverão
encarnados nas crianças. Para consolá-los da dor causada pelas
queimaduras, as mães dizem: “Agora você é gente, meu filho. É
mairum. Você agora é dos mairuns: os que comem beiju, os que gostam de
pacu, os que riem com gozo. Vamos, ria você também.”(p.60) Esse
ritual acontece durante o funeral de Anacã porque esse é o momento
de iniciação dos jovens ao mundo adulto.
- Javari:
competição de lanças cujas pontas estão envoltas em algodão, que
são atiradas aos lanceiros que oferecem seu corpo como alvo
descoberto. Eles podem movimentar-se para os lados ou se defender
com um feixe de varas que levam na mão. Jaguar, representante do
clã dos onças, e Narú, representante dos carcarás, disputam entre
eles quem será o vencedor, mas empatam.
- Huca-huca:
luta entre os homens guerreiros da tribo, entre as várias casas e
entre as metades casamenteiras da aldeia repartida em clãs. “Ganha
quem tomba o adversário ou tão-somente trisca com a mão a dobra de
seu joelho”(p.68)
- Sucuridjuredá:
trata-se de uma caçada à cobra sucuri empreendida pelos guerreiros
da tribo para provar valentia. Após imobilizar a sucuri, os homens
se sucedem, oferecendo o rosto para serem mordidos por ela. Uma
vez mordidos, saem para segurar a cobra no lugar do outro, e assim
ela permanece imóvel. Depois, a mantém viva, “testemunhando na
mata, com sua vergonha, a ousadia mairum”. (p.88)
- Jaguarum:
durante a caçada à sucuri, o valente Jaguar decide perseguir um
jaguarum enorme, uma espécie de onça negra. Afasta-se dos
companheiros e consegue matá-la. Quando chega à aldeia, reveste-se
com a pele da mesma e a oferece para o tuxauambir, o morto Anacã.
- Juruparis:
o ritual dos juruparis acontece em meio à cauinagem, onde todos os
mairuns estão embriagados e se dedicam às experimentações sexuais.
Os juruparis são mais antigos que os homens e vêm do fundo das
águas. Têm o corpo recoberto da lama fétida do fundo dos rios e uma
vestimenta palhosa. São os anhangás, os cabeça de bagre, que
assaltam os lares mairuns para tomarem das mães os filhos homens
mais crescidos. Se alguma delas olhar um anhangá, será estuprada
até morrer, dilacerada por seus membros de pau. Os meninos desesperados
choram. Os anhangás os levam até perto do rio e formam uma roda. Na
verdade, são os tios dos garotos, que se fantasiam para lhes
pregar um susto e marcar a sua passagem para a fase adulta: “(...)
solteiros ou separados, vocês viverão conosco na nossa casa que é o
baíto. Ali não entra mulher, não entra criança. Só nós, os homens
de verdade: Avaetés!”(p.103)
- Dança ritualística:
no centro, dançam ao redor de si mesmas as crianças que receberam
seus nomes e a marca do coraci-mãa; ao seu redor, os rapazinhos que
conheceram os anhangás; em sentido contrário, aqueles que têm a
cicatriz fresca da dentada da sucuridju, de mãos dadas com sua
namorada mais amada da banda oposta; ao redor de todos, a gente
madura, cantando o coro do Avaeté. Depois os homens serão servidos de
comida por suas mirixós, amantes ou parentes, que zelarão por seus
amados. Passarão mais de um dia bebendo, comendo e mantendo
relações sexuais. É o momento da festa dos prazeres.
3) MITOLOGIA MAIRUM: cosmogonia (criação do mundo) e teogonia (criação dos deuses)
A gênese dos mairuns está ligada ao surgimento de Mairahú,
o Criador, o Sem-Nome, o pai de Maíra, que um dia descobriu a si mesmo,
sozinho, e esperou. Chegada a hora, juntou as mãos em concha, soprou um
ar quente dentro delas e lançou do olhar uma luzinha, e assim foi
inventando suas criações. Criou as terras, as águas, separou umas das
outras e criou os juruparis, suas criaturas prediletas.
Eles eram meio peixe, meio gente, e ganharam de presente a noite eterna
que dormia no fundo das águas. Em seguida criou os curupiras,
que eram criaturas incompletas. Alguns tinham só uma perna, ou um olho
só, ou olhos fora do lugar. Eles ocupavam-se em comer as almas de quem
se perdesse à noite na floresta.
Mairahú resolveu criar os avós dos mairuns, os Mairum Ambir.
Não havia homens nem mulheres, todos eram iguais, e não tinham ânus,
comiam e vomitavam pela boca, depois tornavam a comer. Mas todos tinham
uma vulva dentada como boca de piranha, para sururucar —
manter relações sexuais — com o Criador. Bastava bater três vezes na
terra para que uma “cobra-raiz” surgisse do chão. Depois de sururucar
com o Sem-Nome, bastava urinar num pote e, passados cinco dias, a urina
fermentada criava um novo Mairum Ambir.
Enquanto
isso, Mairahú desenhava na areia os bichos, soprava seu alento e eles
nasciam espantados. Todas as criaturas viviam em aldeias e falavam suas
línguas como gente. Cada coisa boa, como o fogo, o sal, o mel, pertencia
a um bicho, que não repartia com ninguém. Não havia dia nem noite,
somente uma penumbra constante. O Criador se divertia mandando para as
criaturas chuvas de fogo ou águas torrenciais. Suas risadas eram as
trovoadas e os raios. Somente os juruparis estavam protegidos no fundo
das águas.
Mairahú,
ou o Ambir, quis então sentir suas criações. Deu um arroto e o lançou
para ser seu filho no mundo. O arroto girou pelos ares e foi parar numa
árvore. Sentiu-a em sua integridade, das raízes até a copa frondosa.
Gozando o sentimento de ser árvore, Maíra fez nascer as florestas
selvagens, multiplicando-se pela primeira vez. O filho do Velho
experimentou ser vários seres, mas voltava sempre à mata. Um dia avistou
um antepassado mairum, Mosaingar. Entrou dentro dele e fez nascer um
útero, no qual se alojou. Sentiu o corpo daquele avô que seria sua mãe
em sua totalidade, a simetria dos lados esquerdo e direito, suas partes,
seus membros, e sua cabeça móvel, com fendas de ver, de ouvir, de
cheirar e de provar. Degustou o gozo de comer e sentir os gostos, mas
não gostou do sarro que ficava na boca depois de vomitar. Reconheceu que
Mosaingar era a melhor criação do Deus-Pai, e percebeu que podia
melhorá-la.
Maíra
pedia a Mosaingar que provasse toda a sorte de frutos e flores, mas
Mosaingar batia na abrriga e dizia: “Filho que ainda não nasceu não
fala”. Mas Maíra apertava-lhe por dentro as partes e Mosaingar acedia.
Quando avistou um bichinho à-toa, um gambazinho fedorento, o
micura-sariguê, Maíra pensou: “Aí está quem há de ser meu irmão gêmeo”.
Chamou-o para dentro da barriga, mas Mosaingar gritava que não, e mordia
Micura com os dentes de piranha de sua vagina. Maíra do lado de dentro
quebrou todos aqueles dentes e Micura entrou finalmente.
Depois
Maíra resolveu que melhoraria a criação de Maíra-Ambir, e os irmãos
deram voltas no útero para nascer. Mosaingar diz: “Filho de não sei
quem, já vou parir? Vejam, você nasce sem pai. Não sururuquei com a
verga de Deus. Como é que você vai nascer, se não é filho do Sem-Nome?”.
Ao que Maíra responde: “Você vai parir dois gêmeos. Não somos filhos de
Deus. Somos os pais dos homens que há de ser”.
Eles
nascem então no meio dos mairuns e Maíra é tão inocente quanto qualquer
criança da aldeia. Elas se divertem com suas brincadeiras, pois podia
se transformar em qualquer bicho que quisesse. Os mais velhos,
assustados, resolvem acabar com os gêmeos, e os levam para o meio de uma
vara de caititus, espécie de porcos-do-mato. Os gêmeos, no entanto,
montam nos porcos e se divertem muito. Levam os bichos até a aldeia e
causam a maior confusão. Os porcos cercam um homem e o comem. Maíra
manda os porcos de volta para o mato e acha bom o extermínio daquele que
mais queria seu fim. “Sem querer, por inocência, Maíra havia fundado a
morte”.
Ele
ordena então que todos riam para não ficarem tristes com a morte, e
todos caem na gargalhada. Os irmãos Maíra e Micura saem andando pelo
mundo, para evitar os pedidos excessivos dos mairuns. Mas sempre
encontravam pessoas que os reconheciam. Eles realizavam os pedidos, mas
com malícia. “A uns que queriam ser bonitos Maíra fez clarinhos mas
muito fedorentos, são os caraíbas. A outros que quiseram tostar a pele
num moreno dourado, Maíra fez negros como tições”.
Maíra depois deu aos mairuns uma genitália masculina, decepando o membro do Deus-pai, para que todos pudessem sururucar
à vontade. As mulheres também pediram um presente, e ele lhes deu o
uluri, uma espécie de tanga, e, junto com ela, a vergonha. Maíra
determina também que “cada par durará o tempo que o desejo e o ciúme o
mantiverem junto”. Divide a aldeia em metades casamenteiras e inventa o
pecado: o incesto. Mairahú, lá do alto, irritado por estar castrado,
olha o grande estrago que o filho faz na sua criação. “Cada dia, cada
noite é uma batalha. Uma dura batalha em que Maíra enfrenta Mairahú para que o mundo fique como é”.
O
Deus ancestral, para se vingar, manda seus cães ferozes, que são
derrotados por Maíra. Mas em seguida, para destruir tudo, envia à terra o
Jaguarunouí, o Grande Tigre-Azul do tamanho do mundo.
Maíra
inventa o arco e flecha para salvar seu povinho mairum. Prega várias
flechas no alto e sobe até lá, acompanhado do irmão Micura. Micura
escorrega e cai, mas Maíra assopra-lhe pelo ânus, e ele incha e flutua,
distraindo o Grande Tigre-Azul. Maíra entre dentro do monstro e destrói
suas entranhas. De sua pele esticada faz o céu. Entra em seu olho e
abre-se em luz, tornando-se Maíra-Coraci, o Sol. Faz do seu irmã
Micura-Iaci, a lua. Mairahú, o Deus ancestral, recolhe-se para o lado de
baixo do mundo, o lado dos mortos, e passa a ser Maíra-Monan, o
Deus-defunto.
“E,
desde então, cada dia e cada noite se sucedem, o sol e a lua iluminando
e alumiando este mundo nosso. É Maíra, é Micura que giram em sua ronda,
sempre atentos contra uma cilada de Maíra-Monan, que pode atacar de
novo, a qualquer momento”.
O mundo civilizado dos caraíbas
O
mundo do homem branco, dito civilizado, também pode ser entendido,
dentro do romance, de acordo com a motivação e as características
principais das personagens que nele se destacam. É, por exemplo, através
do delegado Dr.Ramiro, que reside em Brasília, e que
será o responsável pela apuração da morte de Alma, que tomamos
conhecimento de uma importante característica do índio para a
civilização, muito irônica dentro do contexto da obra:
“O
código civil declara que os índios são pródigos — como os menores, os
alienados, e as mulheres casadas —, quer dizer, irresponsáveis perante a
lei; quer dizer: inocentes”. (p.36)
Nesse universo caraíba, um dos personagens de maior destaque é Juca.
Acompanhado pelos capangas Manelão e Boca, sempre bruto e grosseiro,
tenta explorar os mairuns. É mestiço, filho de mãe mairum e pai branco.
Foi proibido por Anacã de freqüentar a aldeia, por querer seduzir os
índios a trocar peles de lontra por facões, armas e demais utensílios do
mundo civilizado. Ele encarna a ambição capitalista desmesurada. Por
ter pai branco, renega o fato de também ser índio: “não sou bugre, meu
pai era branco e a mãe é apenas o saco onde cresce a semente do homem”.
Segundo a visão de Isaías, “é o mameluco cumprindo sua sina de
castigador do gentio materno”. No entanto, tem um desejo oculto de
dominar os mairuns, inclusive pelo fato de ser da família dos Onças, clã
que produz os tuxauas. Através de sua fala, percebe-se a exploração
predatória da floresta e a destruição do mundo indígena, com as doenças
levadas pelos brancos.
Será ele que ajudará a demarcar e nomear as áreas indígenas que serão desmatadas para a pecuária, segundo planos do Senador Andorinha.
Essas terras serão concedidas a amigos e vendidas a fazendeiros
paulistas e estrangeiros. Juca ambiciona se tornar um grande fazendeiro e
expulsar todos os índios daquelas paragens.
Outro personagem do mundo civilizado fundamental dentro do romance é o Major Nonato dos Anjos,
o responsável designado para investigar a morte da mulher branca nas
beiras do rio Iparanã. Através da narrativa, conheceremos os relatórios
de Nonato acerca de seus inquéritos. Já de início, ele alimenta a vaga
idéia de que Alma teria morrido devido a complicações no parto. Quando
interroga Isaías, fica tentado a incriminá-lo, devido à recusa do
ex-seminarista em ajudar nas investigações. Chega inclusive a ameaçá-lo.
Sobre o “ex-padre, ex-índio, ex-gente”, anota:
“É
um tipinho raquítico, caquético, justo o oposto da imagem que dele eu
formava, pensando nos índios de verdade. Foi praticamente forçado pelo
agente Elias a vir à minha presença. Não queria de nenhum modo
entrevistar-se comigo e se negou a dar qualquer informação”(p.176).
Num
dos capítulos mais importantes do livro, “Exumação”, Nonato nos revela
sua visão peculiar sobre os mairuns. Junto com Elias e Juca, vai até a
aldeia desenterrar os ossos de Alma para verificar a causa mortis.
Elias avisa que os índios veriam aquela atitude como uma profanação.
Mas Nonato acusa os mairuns de preguiçosos, por não os ajudarem na
exumação. Verifica que o crânio da mulher estava intacto, e exclui uma
possível agressão. O investigador se constrange com a “nudez” dos
índios. Observa o comportamento das mulheres, o baíto — a casa dos
homens — e, com as informações que Elias lhe fornece sobre a
naturalidade com que os mairuns encaram a gravidez, conclui:
“Habituados
com suas mulheres que parem como cachorros ou animais selvagens, não
deram qualquer atenção especial ao parto dessa mulher branca e
civilizada (apesar de extravagante) que estava no meio deles. Ela,
vendo-se sozinha, numa praia, com as dores do parto que podem ter
sobrevindo de repente, não teria resistido. Foi vítima de sua própria
afoiteza em meter-se, aventurosamente, por essas matas e aqui deixar-se
prenhar” (p.226)
O antropólogo busca relativizar
seu olhar, ou seja, ele tenta enxergar a cultura do “outro” com o olhar
do “outro”, busca enxergar a cultura diferente da sua com o olhar dela.
Caso contrário, o olhar será etnocêntrico,
preconceituoso, pois interpretará a cultura do “outro” com a visão da
sua própria cultura. A partir do relato burocrático de Nonato,
percebe-se todas as características desse olhar que não relativiza os
valores: os índios são vistos como preguiçosos, indolentes, mendigos,
miseráveis, doentes e sem pudor; e os mais saudáveis, como possível
força de trabalho, como soldados, homens prontos para trabalhos braçais.
O
discurso do Major Nonato é marcado pela objetividade que quer dominar a
realidade, distinguível da fragmentação dos planos indígena e sagrado.
“Nonato escreve uma história que busca manter a verdade objetiva do
discurso histórico-oficial”. Assim, sua visão sobre os mairuns espelha todos os preconceitos da sociedade civilizada acerca da cultura indígena.
Xisto
é um beato que prega na Vila de Corrutela. Em seus sermões, faz questão
sempre de enfatizar a figura do diabo e da transgressão à palavra de
Deus. Acentua os pecados da humanidade e anuncia constantemente o juízo
final. Representa os excessos da religiosidade e o fanatismo.
O Sr. Elias
é um funcionário da Funai que auxilia o major Nonato na investigação.
No entanto, em seu relatório sobre a morte de Alma, Nonato retrata como
Elias não pretende dar qualquer apoio ou suporte aos índios, pois vive
nas terras demarcadas pelo Estado, usufruindo de seus bens e do gado ali
criado. Diz Nonato:
“Pelo
que vejo a coisa está muito bem urdida e justificada para que os índios
fiquem na aldeia como índios e os agentes do Posto como seus remotos
tutores. O resultado é que eles jamais se integrarão nos usos e costumes
da civilização. Mas é também que os funcionários da Funai não perderão
seus empregos de burocratas-afazendados à custa da Fazenda nacional”.
(p.97)
Depois
que constata que bem provavelmente o falecimento de Alma “foi
ocasionado por um parto duplo, ocorrido em más circunstâncias, junto a
índios que nada sabem dos cuidados higiênicos e muitos outros de que uma
mulher civilizada tem necessidade em sua délivrance”, Nonato acusa Elias de negligência, por não ter cuidado para que a mulher branca saísse da tribo a tempo.
Curioso destacar também que Brasília,
localizada no umbigo do Brasil, situa-se onde os mairuns considerariam a
morada de Mairahú, o Deus-Pai feroz e caprichoso. Seria a boca do mundo
subterrâneo, uma espécie de inferno, distante da foz do Iparanã, no
Mato Grosso, o paraíso perdido dos mairuns.
A Missão de Nossa Senhora do Ó
é habitada por missionários penitentes, que se entregam ao árduo e
talvez infrutífero trabalho de catequizar o gentio, os selvagens, os
mairuns. Os padres e as freiras lavam constantemente suas roupas e
banham-se para tirar de si qualquer pecado:
“Os
secos de carnes exibem, virtuosos, a magreza dos seus fáceis jejuns. Os
gordos mal escondem na flacidez das carnes frouxas o sacrifício de
sofridas abstinências. Uns e outros, silentes, se vêem, se julgam e se
perdoam.” (p.160). As freiras não escapam dessa análise dolorosa e
irônica: “Secas vidas de cinzas, sem doce nem sal. Vidas duras, de
carinhos segadas, de desejos podadas. Sofrido povo de Deus, proibido de
si. Enlutados, porque não morrem”(p.160).
Isaías
sente que a Ordem se alimentava dele porque talvez vissem no seu
sacerdócio “a capacidade de erradicar todas as ervas daninhas que os
mairuns tinham na alma. As que cultivaram em séculos e séculos de
heresia. Não sabiam é que, no lugar delas, não plantavam nada”(p.218).
Por fim, Bob e Gertrudes,
que são dois missionários protestantes americanos, instalados num
abrigo feito de chapas de metal, à semelhança com um disco voador, o que
causa grande curiosidade em Alma e Isaías, quando eles os encontram
durante a peregrinação à aldeia mairum. Gertrudes é uma lingüista que
pretende traduzir os evangelhos para a língua indígena, a fim de
catequizá-los. Eles entram em constantes choques com os missionários
católicos, por questões religiosas.
Isaías (Avá) e Alma (Canindejub)
O
romance começa com o capítulo “A morta”, no qual Alma é encontrada pelo
naturalista suíço Peter Becker, numa praia do rio Iparanã, no dia
26/10/1974, nua e morta, com o corpo pintado de traços negros e
vermelhos, formando linhas e círculos. Junto a ela, estão dois gêmeos do
sexo masculino, natimortos, envoltos na placenta e ligados a ela pelos
cordões umbilicais.
Depois
de um passado de libertinagem e uso de drogas, Alma formara-se em
psicologia pela Puc. Tenta então convencer irmã Petrina a deixá-la
partir para a Missão de Nossa Senhora do Ó, a fim de dedicar-se à
caridade com os índios:
“Só
quero que a senhora concorde comigo em que há muitos caminhos para
Deus. Um pode partir da fé e da pureza e por ele chegar ao serviço.
Outro pode partir do mundo, da vivência, das decepções, da análise
mesmo. É o meu caso, por isso começo tão tarde: vinte e três”.(p.63)
Alma
descreve a falta que sempre sentiu da mãe, e a doença e definhamento do
pai, que acaba por criá-la. À medida que chega à puberdade, começa a se
envolver com vários homens em relações vazias e sem sentido. Usa drogas
pesadas e é internada no hospício Pineu. Posteriormente, segundo
sugere, reconquista sua fé na religião, já que o pai era profundamente
católico, e almeja servir a Deus, numa aldeia de índios. A caminho da
Missão de Nossa Senhora do Ó, mesmo com a reprovação das freiras
francesas a quem pediu apoio, por não perceberem nela vocação religiosa
alguma, Alma chega em Brasília e conhece Isaías, que nesse momento
retornava para a aldeia mairum. Durante as investigações, Nonato se
certifica que os dois não tiveram nenhum contato mais íntimo além da
amizade.
Alma
e Isaías seguem juntos até o rio Iparanã, perto da aldeia mairum. Alma
fica curiosa em relação àquele sujeito estranho, diferente da idéia que
ela tem de um índio:
“Ele
é triste, feio e triste, coitado. Nunca pensaria que fosse índio. Nem
imaginava um índio assim de franzino. A única coisa viva nele é o olhar
aceso. Parece calmo, quando fala, mas é controle. É defesa. Na verdade é
um desesperado que nem eu. Não, é um desenganado. E daí? Desenganado ou
desesperado, dá no mesmo.”(p.137)
Depois
de conseguirem uma canoa rústica, eles descem o rio em direção à
aldeia. Alma e Isaías mantêm um diálogo acerca de suas expectativas. Ela
acusa o ex-índio de ser pessimista em relação ao futuro de seu povo.
Ele se mostra preocupado com a reação dos mairuns a Alma, e pensa em
maneiras de não dar a entender que ela é sua mulher, com a desculpa de
que deve tomar como esposa uma mulher do clã dos Carcarás. Alma reflete
sobre sua vida vazia e sem sentido no Rio de Janeiro e alimenta um
desejo de encontrar a si mesma.
Avá
é o nome mairum do ex-seminarista Isaías, que tem o direito de herdar a
posição de tuxaua. Percebe-se nele uma forte contradição em se
valorizar como representante de seu povo e, ao mesmo tempo, esperar se
transformar num homem comum, indistinguível de qualquer outro. Sua
cicatriz mairum, que são duas queimaduras debaixo dos olhos, estão
apagadas, o que representa seu conflito de identidade. A sua posição
remete à fragilidade da situação na qual se encontram os aproximadamente
duzentos mairuns de sua tribo, desamparados e à mercê da vontade do
homem branco. Constantemente há a transcrição das reflexões conflituosas
da personagem sobre sua identidade:
“A
verdade está, porém, com o padre Ceschiatti: minha virtude é negativa.
Mais filha da fraqueza que da força. (...) Não sou, nunca fui nem serei
jamais Isaías. A única palavra de Deus que sairá de mim, queimando a
minha boca, é que sou Avá, o tuxauarã [herdeiro da chefia de guerra dos mairuns por via matrilinear], e que só me devo a minha gente Jaguar da minha nação Mairum”. (p.43-45)
Isaías
ressalta a ambigüidade que há na vida terrena dos mairuns, inclusive na
divisão social da tribo e dos clãs, para em seguida refletir sobre a
sua própria. Quando volta à aldeia, volta em busca do que ficou perdido,
volta para tentar recuperar o passado. Acredita que o verdadeiro Avá
nascerá quando se desvestir de si mesmo, ou melhor, do seu eu cristão, católico, branco:
“Não
sou inocente. Não sou culpado. Sou um equívoco.(...) Fui a ovelha do
Senhor. Volto tosquiado: sem glória sacerdotal, sem santidade, sem
sabedoria, sem nada”. (p.76)
“Sou o outro em busca do um. Sou o que resulto ser, ainda, nesta luta por refazer os caminhos que me desfizeram”.(p.107)
Nas
conversas com Alma, Isaías sempre se refere à devastação dos mairuns
pelas doenças dos caraíbas. No começo do contato, todos os índios
queriam civilizar-se, mas depois notaram que no mundo dos brancos só
lhes cabiam lugares que nem os bichos aceitariam. Antes de chegar à
tribo, ele relembra da doença que lhe fez ir para a missão, e os
cuidados que o padre Vecchio lhe devotou. Sentindo a vocação de
missionário dentro de si, ele resolve partir para o sacerdócio. Já agora
no retorno à terra natal, sente-se depenado e vazio: “eu fui a
mairunidade. Agora sou um índio qualquer”.
Depois
de sobreviverem a uma queda d´água perigosa, Isaías e Alma finalmente
chegam à Missão. Os antigos padres insistem para que Isaías se arrependa
e volte à Ordem, e para que Alma retorne a Brasília. Índias velhas que
moram na Missão atacam Isaías, e ele sente que deve ir direto para a
tribo. Sozinho em seu quarto, o ex-aspirante a sacerdote medita:
“Estou
seco, meu Pai, como a fonte que secou sozinha no deserto, sem matar
nenhuma sede. Tu renunciaste a mim. Eu também renuncio a ti. Minha
vergonha, antes, era meu orgulho: pensava que conduzia no peito, como um
luzeiro, a Tua marca. Sabia que a conduzia. Meu orgulho agora é minha
vergonha: é saber que sempre estive vazio de ti, porque esta é a Tua
vontade. (...) Eu era a minha obra. Agora sei que era uma moeda falsa.
Minha santidade era uma vaidade.
Quando
chegam à tribo, Isaías e Alma causam grande sensação. Todos os homens
mairuns rodeiam o Avá, bebendo assombrados as palavras dele sobre o
mundo dos brancos. O Avá fala sobre a tecnologia, sobre os lugares onde
esteve, sobre suas viagens. Os índios perguntam acerca dos deuses dos
brancos e do seu modo de vida.
Alma
é levada pelas mulheres e tocada, sentida, admirada por todas. Eles
comparam seu corpo feminino ao dela, estranham a presença dos pelos
pubianos, roçam seus pés macios, sua pele lisa, seus cabelos loiros.
O
narrador, antes deles chegarem à aldeia, diz que Alma “adivinha que, de
alguma forma, Isaías está morrendo e ela está nascendo e
vice-versa”(p.233). Jaguar, sobrinho de Isaías, senta-se junto ao aroe
em silêncio, mas este adivinha a indagação. Ambos estranham o Avá, pois
não era aquele propriamente o grande líder guerreiro esperado:
“O
Avá veio na forma do embuçado, do encoberto que não se deixa ver. Sua
forma visível só esconde, só encobre a sua essência verdadeira. É
preciso não o julgar. Não pensar um momento sequer que ele seja
tão-somente o que se vê. Atrás dele está o escondido, o recôndito,
cumprindo a sina que lhe impuseram os pajés-sacacas da Missão. Nele,
através dele, se cumpre algum desígnio. Divino ou demoníaco? Qual?”
(p.252-253)
Os
pajés-sacacas são os missionários, e a sina refere-se ao destino de
Isaías, inicialmente traçado de modo a se tornar o tuxauareté, o maior
líder guerreiro de todos, mudado para ser o sacerdote que iria
catequizar os mairuns. Ao longo da narrativa, percebe-se que a
personagem transitará entre esses dois mundos para sempre, e jamais
conseguirá assumir totalmente sua identidade indígena novamente. Sua
visão sobre os mairuns se assemelha à que os brancos têm dos índios
porque, quando retorna, os vê como preguiçosos que vivem à toa, fazendo
brincadeiras inúteis, relegando o trabalho aos mais velhos e às
mulheres. Estas, ao invés de produzir mais, demandam seus esforços em
fazer balaios e artefatos que expressem suas particularidades, ao invés
de fazer algo que pudessem vender.
Logo
que chega, Isaías tem a idéia de canalizar para a produção agrícola o
vigor dos mairuns, de motivá-los para o setor econômico, introduzi-los
na vida prática. Os índios, mesmo sabendo que aquela não era a época das
plantações, obedecem ao Avá, mas as plantações fracassam, as plantas
não germinam adequadamente. Alma adverte o amigo, admirada que está com a
vida indígena, de que os mairuns já fizeram a “revolução-em-liberdade”:
“Não
há ricos, nem pobres; quando a natureza está sovina, todas emagrecem,
quando está dadivosa, todos engordam. Ninguém explora ninguém. Ninguém
manda em ninguém. Não tem preço essa liberdade de trabalhar ou folgar ao gosto de cada um”(p.256).
Os
mairuns acreditam na existência de uma Terra sem Males, e crêem que
todos, independentemente de seu comportamento, irão para o céu. Essas
idéias se chocam com as do Avá, agora um índio cristianizado, que sem
perceber, deseja imprimir no mundo indígena as marcas do mundo dos
caraíbas, dos civilizados, obrigando-os a trabalhar visando o lucro, e
não a subsistência.
No
capítulo “Maíra : Remui”, quando o deus Maíra entra dentro do aroe e
fala através de sua boca, temos a transcrição de suas dúvidas em relação
ao Avá, e uma reflexão sobre a única possibilidade de salvação para os
mairuns que, afinal, se relacionará com a simbologia por trás da morte
de Alma:
“O
Avá veio e não veio. Este que veio é e não é o verdadeiro Avá. (...)
Este é o que restou de meu filho Avá, depois que os pajés-sacacas mais
poderosos dos caraíbas roubaram sua alma. Ele anda por aí, meio
dormindo, perdido para si, perdido para nós. Atrás dos seus olhos está a
névoa, a cegueira dos que já não têm alma para morrer. Ele não é mais
um vivente mortal, como nós. (...)
Nós,
os mairuns, estamos acabando. Conosco acaba Maíra-Monan, Mairahú,
Maíra-Ambir o nosso Criador. Quem começou tudo isso foi mesmo
Maíra-Coraci.(...) Quem sabe o Velho, o Sem-nome, manda outro arroto
dele, para entrar em alguma Mosaingar? Aí, nasceriam outra vez os filhos gêmeos do Senhor, para começar tudo de novo”(p.258).”
No
capítulo “Maíra : Teidju”, temos as lamentações do oxim, que reclama da
vida reclusa e isolada de curandeiro que leva, por sofrer preconceitos
dos demais. Os mairuns têm uma relação de amor e ódio com o feiticeiro,
por ele poder supostamente dar a vida como trazer a morte, e cobrar o
que quiser por seus serviços. Como não consegue caçar ou exercer outros
afazeres tribais, Isaías acaba buscando a companhia do oxim. Mas Teidju
pressente um fedor de morte, um anúncio de agouro através dos animais da
natureza.
Já
no capítulo “Maíra : Jaguar” temos a revelação dos anseios do sobrinho
de Isaías sobre o posto de tuxaua. Seguindo a tradição, seria Jaguar o
tuxaua depois da morte de Isaías, no entanto, ele já se sente
pressionado a assumir o posto, pois o Avá se mostra cada vez mais inapto
a assumir o posto. É sua voz que nos revela as relações sexuais que
mantém simultaneamente com Inimá, a mulher destinada ao tio Avá, e Alma,
a branca loira Canindejub que acaba por se integrar à cultura mairum.
Isaías repreende Alma por manter relações com vários índios, e diz que ela está se tornando uma mirixorã,
ou seja, uma mulher disponível, que não se casa, não tem filhos e não
possui nenhuma interdição clânica que a impeça de se relacionar
sexualmente com qualquer mairum.
Em
“Micura : Canindejub”, a voz do deus Micura Sariguê, irmão de Maíra, se
manifesta através de Alma e nos dá uma interessante visão sobre a
sensualidade e a libido dessa mulher branca que quer viver como índia:
“Ó
mulher macha, vive do seu sumo. De todo o corpo tira gozo, gozoso. Tira
e dá. É uma beleza esta pele lisa, coberta de penugem, com seus tufos
de pentelhos. Bem esticada, esse pelame daria para cobrir minha cara na
cheia. Pele de pêlos e poros sensibilíssimos. Feita para sentir as
vibrações do ar, para outros corpos saborear.” (p.314)
Micura
ainda diz que talvez voltará para deixar uma semente dentro de Alma, o
que sugere como, num plano metafórico, os filhos que a Canindejub
perderá são fruto de um acasalamento simbólico com os deuses mairuns.
Durante
sua gravidez, Alma se pergunta como fará para dar a luz ao filho —
aparentemente, ela não sabe que está grávida de gêmeos — e se conseguirá
parir como as índias. Reflete também sobre sua identidade e a do filho,
já que ele é uma mistura, e ela mesma está misturada, pois é uma branca
que assumiu uma postura de mirixorã, mas que não deixa de ser uma
civilizada:
“Que
será este meu filho ou esta minha filha? Será mairum como eu quero que
seja? Será um branco, um caraíba, no sentido de civilizado e de cristão,
como eu fui, como eu era, como ainda sou, apesar de mim? (...) Aqui um
filho pertence à mãe. É do clã da mãe. Respeitará ao tio, nunca ao pai.
Este meu filho, por isso, apesar de tão mairum que é, é um filho meu, do
clã que não tenho. (...) Mas é muito ruim para uma pessoa ser apenas um
pouco alguma coisa. Fica dependurada entre dois mundos, como este pobre
Isaías, ou como eu mesma” (p.328)
“O
mal de Isaías é ser ambíguo. Ser e não ser. Não é índio, nem cristão.
Não é homem, nem deixa de ser, coitado. Ser dois é não ser nenhum,
ninguém”. (p.346)
É
notória a identificação entre as figuras das personagens, porque ambas
passam por conflitos de identidade. No entanto, enquanto Isaías pretende
resgatar o que está perdido, sua posição de tuxauarã, de herdeiro do
tuxaua Anacã, Alma não deseja “mairuzinar-se” completamente, mas, sim,
quedar-se na aldeia enquanto lhe der prazer. Apesar disso, tanto Alma
quanto Isaías passam por um processo de desintegração de suas
identidades étnicas.
Quando
finalmente vê a índia Mbiá dando a luz, Alma se assusta com os costumes
mairuns. O marido segura a mulher pelos sovacos e ela faz força para
baixo. Quando a criança nasce, é limpa e o cordão umbilical é cortado,
mas a mãe se levanta em seguida. Será o pai que ficará no choco, de resguardo. Alma completa:
“Os
partos que eu conheço de ouvir contar são traumas terríveis, com
berreiros e sofrimentos medonhos. Sobre nós pesa até hoje a praga
divina: hás de parir com dor”. (p.349).
Alma
possuía, segunda ela mesma, uma vida libertina e vazia, que deixa de
lado para aspirar uma vida cristã, com o intuito de reformar uma
sociedade selvagem. Em contrapartida, Isaías rompe com sua formação
religiosa e anseia uma vida pagã, para restabelecer os valores de seu
povo mairum. Apesar disso, Alma, mesmo com seu espírito profundamente
crítico, respeita os costumes indígenas, adapta-se à vida mairum. Já
Isaías se crê igual aos mairuns, mas não consegue se desvencilhar do
mundo cristão onde é educado, e por isso enxerga os índios através de
preconceitos sociais e religiosos.
Isaías
afigura-se, portanto, como o mediador entre dois mundos, que encarna o
violento processo de transformação da identidade. É um ser ambíguo,
cujas preces antecipam o fracasso de sua reintegração à sociedade dos
mairuns, porque pede, ao mesmo tempo, para o Deus cristão e para os
deuses mairuns para torná-lo novamente indistinguível entre os demais
índios — ele pede a um deus cristão que o torne novamente numa criatura
pagã. Já Alma repudia a sociedade em que vive, acreditando que possui
uma vocação religiosa para ser missionária entre os índios. Mas, ao
invés de modificá-los, acaba aceitando-os.
As mortes
O
final de Maíra é todo marcado por mortes, o que sugere o sentido do
sacrifício apontado pela estruturação do romance na forma da missa
católica, conforme apontado no início do estudo.
A
personagem Juca, o “subproduto oficial entre a civilização e a aldeia”,
através de quem se faz conhecer a miséria econômica e moral do trabalho
escravo dos barranqueiros
e a ambição desmesurada que ajudará a destruir a floresta amazônica, é
morto, junto com seu capanga, supostamente pelos selvagens xaepes.
Xisto,
o fanático que “traduz a obsessão religiosa resultante de uma cultura
mal assimilada”, arrancará a língua de Perpetinha, uma de suas mais
fiéis seguidoras, e depois a matará. Apesar de ser ferido, ele corre
para a mata e se esconde.
Uma
indiazinha mairum, Cori, será mordida acidentalmente por uma cobra, e
morrerá também. Os mairuns a levam desesperadamente ao oxim, mas ele não
consegue fazer nada pela garotinha. Embalados pela fúria, os índios
matam Teidju com as próprias mãos.
Os padres mais velhos da Missão de Nossa Senhora do Ó também falecem.
Uma
das partes finais do romance é composta pela cerimônia de amarração do
tuxaua. Será Jaguar quem assumirá afinal o posto de líder da tribo, já
que Isaías não conseguiu impor-se como o chefe. Ele pede com o olhar ao
aroe Remui que o amarre; em seguida, amarra seus companheiros, que se
tornam seus miaçus-guerreiros. Porém, no dia seguinte, todas as
mulheres, inclusive as meninas, amanhecem menstruadas. Segundo a cultura
mairum, a menstruação é causada pela flechada do deus Micura. O sangue
que escorre é o dos filhos que as mulheres carregariam dentro de si e
que não nascerão, o que se afigura como motivo de dor e vergonha para
elas.
Além
de todas essas mortes, a de Alma e dos gêmeos que carregava dentro de
si, que abre o romance, permeia todo o enredo e traduz a destruição do universo mítico dos mairuns.
O mito representa a memória, já que para ser conhecido é necessário que
ele seja narrado, contado, presentificado através de uma narração, para
não ser esquecido. Fundamentados numa concepção cíclica de mundo,
os mairuns, após a situação desagregadora da morte de Anacã, negam a
idéia do fim definitivo através dos rituais de reintegração, que acabam
por preservar a vida indígena.
A própria narração dos rituais serve para recuperar a identidade mairum
e reafirmar o tempo e o espaço de origem. Anacã representa, então, a
memória a ser conservada dentro da tribo; os rituais da cerimônia
fúnebre ajudam a inscrever sua “morte gloriosa” na memória dos índios.
Assim, no romance, a busca dessa memória é o resultado de uma ordem
social e cultural já fragmentada pelo processo civilizatório do homem
branco.
Os
mairuns, como dito, vivem imersos num tempo circular, mítico, dentro do
qual a vida se repete: “O círculo está escrito no pátio, no baíto e na
aldeia. Nesses espaços, os mairuns distribuem-se também em forma de
círculo, de roda, conforme a organização clânica”.
Alma, portanto, é vista pelos mairuns como a Mosaingar, aquela que está
prenhe do plano sagrado, que dará a luz a novos deuses que, como o aroe
Remui destaca, farão começar tudo de novo, ou seja, trarão a renovação
para a vida indígena.
No
entanto, metaforicamente, a morte de Alma e dos gêmeos representa a
morte da própria cultura indígena em contato com o mundo civilizado.
Significa um rompimento dessa circularidade, dessa vida cíclica, do
universo mítico, e a inscrição brutal do mundo indígena no mundo dos
brancos.
Junto
com o mundo indígena, morrem seus costumes, suas tradições e,
sobretudo, seus deuses. No capítulo “Mairañee”, Maíra reflete sobre o
fim de seu povo e de si mesmo, chamando-se de um “Deus-mortal”:
“Sem
eles, quem me há de lembrar, louvar? Povo meu que refiz quebrando molde
de Deus-Pai. Quem fez o meu pai fui eu. Mas quem me fez?
Um mundo despovoado de mairum-mairuns não estará, coitado, de mim também despojado?” (p.332)
Egosum
O
capítulo “Egosum”, que em latim significa “sou eu”, encontra-se
precisamente no meio da obra. É uma espécie de marcação proposital feita
por Darcy Ribeiro, para deixar sua voz sobressair-se em relação à voz
do narrador onisciente que aparece com freqüência.
Nesse
capítulo, pode-se considerar que há uma escrita auto-biográfica,
disfarçada de escrita literária. Ao mesmo tempo que se afirma que a voz
presente é a do próprio Darcy Ribeiro, autor de Maíra, sugere-se a
presença de um metanarrador, ou seja, um narrador que fala sobre os demais, ou que se encontra acima das outras vozes narrativas.
Trata-se
de um capítulo repleto de lirismo, decorrente do uso da primeira pessoa
aliada à manifestação poética da linguagem. Nele, o autor/metanarrador
revela que o Avá que conhecera se chamava Tiago, e que o vira emplumando
os ossos da filhinha entoando uma ladainha em latim. Anacã,
segundo ele, “era baixinho, gordo e risonho. O mais parecido com um
intelectual que eu encontrei num índio”(p.204). Numa interlocução
imaginária com o poeta Carlos Drummond de Andrade, ele revela a
inspiração para a personagem advinda dos “barrocos profetas
vociferantes” esculpidos por Aleijadinho: Isaías, o da boca queimada
pela palavra de Deus.
Essa
voz narrativa peculiar relata suas experiências pessoais com as tribos
indígenas. Durante a convivência com os índios, ela revela, talvez, o
grande conflito que impulsiona a obra, que é o da impossibilidade de
aceitar totalmente a cultura do “outro”, o choque cultural decorrente da
necessidade de entendimento de uma cultura diferente:
“Aqueles
meses de convívio inelutável da maloca quase me enlouqueceram. Só na
prisão das quatro paredes me senti assim contido e constrangido.
Condicionados a viver em casas com muros e portas para nos isolar, para
nos esconder, não suportamos aquela comunicação índia sem fim, de dia e
de noite, vivendo sempre uma vida totalmente comungante.” (p.205)
Esse
Darcy Ribeiro disfarçado de narrador refere-se também ao seu
enfrentamento com a morte, quando se viu cara a cara com um índio
furioso, que acabara de perder seu único filho, e que por isso tinha o
“direito”, segundo os costumes indígenas, de fazer o que quisesse para
acalmar-se. Acrescenta :
“Mas
quando me veio a hora do medo, do medo derradeiro, do medo feroz de
saber, afinal, com certeza certa que sou mortal e que viverei,
doravante, de mãos dadas com a minha morte; então, só então, percebi que
o urgente é viver. Estou aprendendo”.(p.207)
O capítulo termina com uma reflexão poética sobre a continuidade da existência através da memória:
“Ai
vida que esvai distraída, entre os dedos da hora, tirando da mão até a
memória do tato dos meus idos. Só persistimos, se tanto, na usura da
memória alheia, à véspera do longo esquecimento.” (p.207)
O
capítulo “Egosum” sintetiza, assim, as três temáticas principais de
Maíra: o choque cultural, que será retratado através dos conflitos
vivenciados por Isaías e Alma; a idéia da morte, associada ao fim da
cultura indígena em contato com a civilização; e a importância da
memória como uma barreira à finitude definitiva, já que a narração dos
rituais e da mitologia mairum constituem a inscrição e a perpetuação de
sua cultura num futuro incerto.
BIBLIOGRAFIA:
COELHO, Haydée Ribeiro. Exumação da memória. 1989. 212 f. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.
NETO, Arnaldo Rosa Vianna. Multiculturalismo e pluriculturalismo. IN: Conceitos de literatura e cultura. Org: Eurídice Figueiredo. Juiz de Fora: UFJF, 2005.
RAMOS, Maria Luiza. Maíra: leitura/escritura. Cadernos de Lingüística e Teoria da Literatura, Belo Horizonte: UFMG, 1985. p.149-177
RIBEIRO, Darcy.Confissões. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
RIBEIRO, Darcy.Maíra: um romance dos índios e da Amazônia. Rio de Janeiro: Record, 2007.
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EXERCÍCIOS
(Amarelo para a resposta correta)
1) Todos os personagens, que caracterizam o livro Maíra, de Darcy Ribeiro, transitam entre a aldeia e a civilização, exceto.
a) Alma.
b) Isaías.
c) Juca.
d) Anacã
O Tuxaua, O Chefão, nasceu, viveu e morreu sem arredar o pé da aldeia.
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2) Todas as alternativas abaixo sobre a obra Maíra, estão corretas, exceto.
a) A viagem do personagem Isaías é geográfica e existencial.
b) A presença do Estado no universo indígena é marcada pela negligência, pelo descaso.
c) O major Nonato, designado a investigar a morte de alma, sensibiliza-se com os costumes indígenas.
Não há menção na obra sobre o major Nonato se sensibilizar com os
costumes indígenas. As demais alternativas estão corretas com base no
contexto fornecido. Página 233, 293.
d)
Os trabalhos missionários entre os índios são realizados por católicos e
protestantes, e são vistos ironicamente como inócuos.
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3) Todas as alternativas abaixo sobre o deus Maíra, estão corretas, exceto.
a) Maíra vive, num primeiro momento, como força da natureza.
b) Maíra é um deus que reforma o mundo do Deus-Pai.
c) Maíra transforma-se em Iaci, a lua, enquanto seu irmão, Micura, transforma-se em Coraci, o sol.
Página 179
do livro menciona que Maíra se converte em MaíraMCoraci, o Sol, enquanto
seu irmão Micura se torna a Lua. As demais alternativas estão corretas,
portanto a incorreta é a letra c.
d) Maíra desce do céu e penetra no corpo de vários personagens.
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4) Todas as partes que compõem o romance Maíra, encontram-se devidamente identificadas, exceto.
a) Em “Antífona”, primeira parte de Maíra, os rituais de reintegração à vida e de integração à morte iniciam e terminam com a morte de Alma.
Esse e o mistério de todo o livro.
b) Em “Homilia”, observa-se o relato sobre a mitologia mairum e a trajetória da viagem dos protagonistas, Isaías e Alma.
c) Em “Cânon”, tem-se o desdobramento do deus Maíra em vários “eus”, ao partilhar com os homens as experiências terrenas.
d) Em “Corpus”, última parte do romance, observa-se o término do ciclo mairum, em que Jaguar se transforma no tuxaua de seu povo.
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5) Com base na leitura de Maíra, de Darcy Ribeiro, é INCORRETO afirmar que:
a) exalta os valores culturais dos índios, mas faz um alerta contra o seu extermínio gradual causado pela civilização.
b) demonstra o choque cultural no plano da narrativa através da estruturação do romance a partir das partes da missa católica.
c)
configura-se como uma obra com uma visão romântica sobre o povo
indígena, fruto dos árduos trabalhos do autor junto aos índios mairuns.
Essa afirmação não condiz com o texto fornecido, pois não há informações
específicas que indiquem que "Maíra" seja uma obra com uma visão
romântica sobre o povo indígena. A obra parece ter uma abordagem mais
ampla em relação à cultura indígena, incluindo elementos como o senso do
maravilhoso e fundamentação científica. Além disso, o autor Darcy
Ribeiro teve trabalhos junto a diversas etnias indígenas, não apenas os
mairuns, como mencionado no texto.
d)
trata-se de uma narração que exalta a diversidade cultural do Brasil,
mas que não deixa de mostrar o impacto existente entre as culturas que
compõem o país.
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6) Com base na leitura de Maíra, de Darcy Ribeiro, só é CORRETO afirmar que:
a) Isaías rejeita o sacerdócio por descobrir em si a semente do ateísmo.
b) Alma encontra dentro do meio mairum o ateísmo que sempre soubera estar dentro de si.
c) Anacã prediz a vinda do novo tuxaua que salvará os mairuns da extinção, por isso decide morrer.
d)
Remui tem visões sobre o novo tuxaua, mas elas são frustradas quando o
Avá retorna numa forma diferente da imaginada pelo aroe.
Isso se infere no texto onde há menções às visões, ao retorno de Avá e à decepção com a forma como o Avá retorna. Isaías, Avá é um decepção, uma negação total, um cara brocha, literalmente.
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7) Quanto à polifonia presente em Maíra, é CORRETO afirmar que:
a) espelha o preconceito existente no meio civilizado em relação aos índios.
b) demonstra a impossibilidade de se abarcar a cultura indígena através exclusivamente do olhar do mundo civilizado.
Isso está relacionado ao fato de que o autor, Darcy Ribeiro, se impregnou das lembranças e cenas de aldeia, transmitindo ao leitor as bases espirituais e materiais de um mundo primitivo que transcende e desafia o mundo dos civilizados (página 367).
c) sugere a coexistência harmônica entre as diversas culturas no Brasil.
d) liga-se à constituição multicultural brasileira, para exaltar a propagação da cultura indígena no mundo dos brancos.
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8) Sobre as personagens Alma e Isaías, de Maíra, só é CORRETO afirmar que:
a) Alma é uma carioca que engravida dentro da tribo mairum e passa a desprezar o modo de vida indígena.
Alma não parece ter uma visão positiva da vida indígena. Ela se refere aos povos indígenas como “os índios” e “índios mairuns” e menciona que eles jamais se integrariam aos costumes e costumes da civilização. Ela também expressa desdém pela burocracia da FUNAI, sugerindo que seus funcionários não perderão o emprego às custas da fazenda nacional. (Página 77)
b)
após Alma engravidar, ela teme perder os gêmeos que carrega dentro de
si por causa da falta de amparo médico dentro da aldeia.
c) Isaías mantém uma relação pessoal distanciada de Alma devido ao seu pudor alimentado pela formação religiosa.
d)
Isaías é o Avá que renunciou ao seu posto de tuxaurã dentro do mundo
mairum, e que retorna à aldeia na tentativa de encontrar a si mesmo.
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9) São temáticas pertinentes à análise de Maíra, EXCETO:
a) o desencantamento do mundo através da destruição dos deuses indígenas.
b) a imposição da lógica capitalista dentro do universo indígena.
c) o conflito gerado pelo choque entre culturas que começaram a se discriminar na atualidade.
O conflito gerado pelo choque entre culturas que começaram a se discriminar na atualidade pode ser devido a uma série de fatores, incluindo diferenças culturais, históricas e sociais. No texto fornecido, há menção a uma situação em que um homem chamado Elias, provavelmente um funcionário da FUNAI, exuma um corpo de uma mulher branca que morreu de forma misteriosa entre os índios. Isso pode ser um exemplo do choque entre culturas, onde as práticas e crenças dos índios e dos não-índios entram em conflito, levando a situações de discriminação e desconfiança. Além disso, há menção de uma casa-fortaleza construída em uma região frequentada pelos índios hostis, o que também pode ser um exemplo do conflito entre culturas. No entanto, é importante ressaltar que as razões para tal discriminação e conflito não são explicitamente fornecidas no texto, então parte da resposta pode ser uma inferência com base no contexto fornecido.
d) a frustração dos mairuns diante da marginalização presente no mundo civilizado.
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10) Sobre a mitologia mairum, é INCORRETO afirmar que:
a) Mosaingar é a mulher virgem que engravida do Deus-Pai para dar a luz aos novos mairuns.
Mosaingar não é a mulher virgem que engravida do Deus-Pai. Na verdade,
Maíra e Micura nasceram como gêmeos, e Maíra afirma que não são filhos
de Deus, mas sim os pais do homem que há de ser. Não é mencionado que
Mosaingar seja a mãe virgem nesse contexto. Pelo que foi apresentado,
Mosaingar não é a mãe dos novos mairuns. (páginas 129 e 310)
b) Maíra satisfaz aos anseios orgânicos e pessoais dos ancestrais dos mairuns.
c) Mairahú é visto como um deus feroz, arbitrário e caprichoso, que não se importa com o bem-estar dos mairuns.
d) Micura é o irmão de Maíra que o acompanha nas suas peripécias de modificação do mundo originalmente criado por Mairahú.
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11) Dos episódios destacados abaixo, só se narrado no romance Maíra:
a) os rituais que envolvem o sepultamento de Alma.
b) os anos de seminário de Isaías.
c) a travessia de Alma e Isaías em busca da tribo dos mairuns.
Eles embarcam em uma jornada pelo rio Iparanã em busca da tribo e enfrentam diversas situações ao longo do caminho.
d) as visões de Anacã sobre o novo tuxaua.
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12) Para compor Maíra, Darcy Ribeiro utilizou todos os recursos destacados abaixo, EXCETO:
a) linguagem burocrática e objetivista.
b) transcrição de documentos e cartas oficiais.
c) linguagem poética redundante e paradoxal.
d) referências intertextuais bíblicas.
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13) Sobre a narração dos rituais que cercam a morte de Anacã, é INCORRETO afirmar que:
a) legitimam a importância do tuxaua dentro da tribo mairum.
b) ajudam a preservar sua identidade de tuxaua e a inscrevê-la na memória coletiva.
c) conferem importância ao aroe Remui, que passa a ser o responsável pela chefia da tribo.
A narração dos rituais que cercam a morte de Anacã mostra que, de acordo
com o texto, o aroe Remui passa a ser o responsável pela chefia da
tribo, o que torna a opção c) correta. Portanto, a afirmativa incorreta é
a letra c).
d) liga-se à renovação decorrente do término de um ciclo e o início de outro, no caso, o da chefia da tribo.
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14) Leia atentamente o trecho do depoimento de Darcy Ribeiro:
“Assim
foi que aprendi a olhar os índios com os olhos deles mesmos. A partir
de então, caí num questionamento de mim mesmo como antropólogo.
Primeiro, pela crítica da etnologia aparentemente científica e inocente
que cultivara até então, estudando parentescos ou mitologias ou
colecionando artefatos, num total descaso pelo trágico destino dos
índios que contavam os contos ou faziam os artefatos”.
Com base no texto acima e em seus conhecimentos sobre Maíra, só é CORRETO afirmar que:
a) o autor propõe o isolamento dos índios em reserves para evitar o contato com o homem branco.
b)
o autor sugere a importância do olhar descentrado do antropólogo, que
propicia o entendimento sensível sobre a cultura que estuda.
Darcy Ribeiro passou a olhar os índios com os olhos deles mesmos,
questionando a forma como ele, como antropólogo, havia estudado os
índios até então. Ele critica a etnologia aparentemente científica e
inocente que cultivara, que estudava parentescos, mitologias ou
colecionava artefatos, sem se importar com o trágico destino dos índios.
A partir disso, pode-se inferir que Darcy Ribeiro sugere a importância
do olhar descentrado do antropólogo, que propicia o entendimento
sensível sobre a cultura que estuda.
c) o autor conclui que todo olhar científico sobre os índios é precário, porque trata de uma cultura demasiadamente primitiva.
d) o autor discute algo que extrapola o romance Maíra, mais voltado para a retratação poética da cultura indígena.
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15) Leia atentamente o trecho do depoimento de Darcy Ribeiro:
“Nunca
escrevi nada com tanta emoção, mesmo porque meu tema ali era dar
expressão ao que aprendi, no longo convívio com os índios, sobre a dor
de ser índio, mas também sobre a glória e o gozo de ser índio. Enquanto
eu o escrevi, eu estava lá na aldeia com eles. Era, outra vez, um jovem
etnólogo, aprendendo a ver seu povo e a ver o meu mundo com os olhos
deles”.
Com base em seus conhecimentos sobre Maíra, é INCORRETO afirmar que o trecho acima:
a) demonstra a habilidade do ficcionista em recriar culturas primitivas e desprezar a visão científica.
O trecho mostra que Darcy Ribeiro se identifica com a cultura indígena e
busca transmitir as emoções e a visão de mundo dos índios, não
desprezando a visão científica, mas sim integrando-a com as experiências
vividas na aldeia.
b) justifica o recurso da polifonia dentro do romance.
c) aborda a temática da destruição da cultura indígena.
d) explica a existência da voz narrativa do autor ficcionalizada dentro do romance.
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Gabarito
1) d
2) c
3) c
4) a
5) c
6) d
7) b
8) a
9) c
10) a
11) c
12) c
13) c
14) b
15) a
COELHO, 1989
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Referências:
OLIVEIRA. Andrade, Aloísio. PROSA. Oficina de textos_UFMG 2011 - Salinha para resolução de questões abertas de Literatura (vestibular UFMG 2011). Disponível em: http://literatura2pontos.blogspot.com/2008/06/estudo-de-obra-mara.html. Acesso em 04 Dez. 2023