A Estética da Criação Verbal de Mikhail Bakhtin, a Liberdade Interior, o Coliseu da mente e a Linguagem Interior


O livro Estética da Criação Verbal, de Mikhail Bakhtin, aborda a natureza dialogística da linguagem (sobretudo, a complexidade da interação) e da criação verbal. Ou seja, ele enfatiza a importância do diálogo e da interação social na expressão verbal. Bakhtin introduz os conceitos de polifonia (basicamente: múltiplas vozes e perspectivas em textos) e, ainda que indiretamente, a  heteroglossia (que à grosso modo é a interação das múltiplas vozes e discursos), que será tratado mais tarde em outra obra. Ao contrário do que vemos no início das escolas de linguagem, como o Estruturalismo de Saussure que, de certa forma, não considera, propriamente dito, a influência do contexto social como fator determinante para a análise da linguagem, em Bakhtin, observa-se fortemente a influência do contexto social e histórico na compreensão da linguagem e, consequentemente, da escrita em geral e, no caso específico, das  obras literárias quanto aos gêneros do discurso, até mesmo como uma evolução para o entendimento dos gêneros literários, considerando de fundamental importância o enunciado: [...] “O estudo da natureza do enunciado e dos gêneros do discurso tem uma importância fundamental para superar as noções simplificadas acerca da vida verbal, a que chamam o “fluxo verbal”, a comunicação, etc., noções estas que ainda persistem em nossa ciência da linguagem.” [...] (BAKHTIN, 1997). Bakhtin vê a criação verbal como um processo em constante interação com o mundo ao redor, refletindo a diversidade de vozes e pontos de vista na sociedade. Agora, imagina o que seria estudar e discutir isso, mesmo com o círculo de Bakhtin (um recanto  livre da paranoia estatal), numa União Soviética paranoica, de tremenda censura e perseguição a qualquer tipo de discurso diverso do aparelhamento estatal? É por isso que Bakhtin só se torna conhecido após a década de 60, em face de uma certa flexibilização estatal quanto às questões acadêmicas, e mais ainda após sua morte em 1975. Peço escusas ao me delongar nesse breve parágrafo, mas é muito”louco” pensar como os ditos cujos “politicopatas”, como eu os chamo em alguns livros que publiquei, em toda a história, tentam inutilmente “sequestrar, torturar, aprisionar e assassinar ideias, pensamentos e o desenvolvimento/progresso humano, achando que podem deter o “caminhar do tempo”. É impossível deter o “caminhar do tempo”. E Bakhtin, só nessa obra, ao tratar de Dialogia e Polifonia comprova isso de diversas maneiras. Assim como a linguagem que é, de certa forma,  uma arena de intercâmbio e confronto de diferentes pontos de vista, ideologias e vozes sociais, a mente humana é um ‘Coliseu’. Ou seja, essa obra de Bahktin nos comprova que por mais perseguição, censura, cancelamento, assassinato de reputação, repressão e violência estatal e militante que hajam, é impossível deter a capacidade humana de manter um diálogo consigo mesmo, em múltiplos níveis, envolvendo múltiplas vozes e perspectivas dentro da própria mente: [...] “Quando construímos nosso discurso, sempre conservamos na mente o todo do nosso enunciado, tanto em forma de um esquema correspondente a um gênero definido como em forma de uma intenção discursiva individual.” [...] (BAKHTIN, 1997). Com efeito, a meu ver, é assim que a Liberdade Interior, sobretudo, o “Estar Bem consigo mesmo, mesmo num momento ruim ou numa era trevosa e tirânica,” que se manifestam numa “Linguagem Interior”, fazem o Ser humano sobreviver, superar e ressignificar o seu sentido da Vida. É claro que há muito mais a se aprofundar sobre Bakhtin, sobretudo, a linguagem, o poder da linguagem em relação à interioridade e a alteridade, considerando a complexidade social e a interação social.

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Texto de E. E-Kan


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Referência

BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: ______. Estética da criação verbal. Tradução de Maria E. Galvão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997 [1979]. p. 277- 326 Reflexão proporcionada por uma atividade da disciplina de Ensino da Lingua Portuguesa, ministrada pela Professora Drª Charlott Eloize Leviski, na UEPG/2023.

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