O Apolíneo e o Dionisíaco: a razão, a loucura, o caos, a luz e a escuridão que somos


Há quem ainda tema ser de tudo um pouco (Apolíneo, Dionisíaco, razão, loucura, caos, luz e escuridão). Muitos dos animais pensantes, durante toda a vida, temem aquilo de que são feitos, luz e trevas, e por isso, mascarados, fogem do que são como o ladrão na noite. 

Lutar contra os instintos, contra as forças da vida, sobretudo, contra as forças criadoras, é o mesmo que negar a si mesmo veementemente e lutar inutilmente contra o fato de que se é, em essência, goste ou não, Ser em Revolução e Evolução, numa estrada cujo horizonte se perde de vista e sobre a qual ninguém sabe onde vai dar. 

Quando falamos que somos animais pensantes e filosofantes e ao mesmo tempo Seres/Consciências/Espíritos em Revolução e Evolução, sobretudo, que ainda somos como meras partículas de poeira cósmica pensantes diante da Imensidão Cósmica Interestelar, da Incomensurabilidade da Vida e da Inefabilidade da Existência, temos claro que somos, sem culpas, sem máscaras, sem âncoras de complexos limitadores, de tudo um pouco, aprimorando esse "de tudo um pouco" e a compreensão desse "de tudo um pouco" que somos, Apolíneos e Dionisíacos ao mesmo tempo, isto é: racionais, loucos, caóticos, iluminados e sombrios. Sobretudo, ainda, estamos cientes de que cedo ou tarde, tudo isso será superado para dar lugar a um nível maior de compreensão da Vida com tudo o que nela há e com o "de tudo um pouco" que somos e sempre seremos, ao mesmo tempo, luz e trevas, nos equilibrando sobre a corda bamba da Existência, tentando evitar que acabemos como o equilibrista do Zaratustra do Nietzsche. 

 (In___ Livro: Miscelânea Insólita -  Aforismos, poesias, experiências e pensamentos, E-Kan, 2022).  

(Imagem: Fórmula do Cosmos, de Pavel Filonov, 1918/19).

 

O equilibrista

[...] Mas então sucedeu algo que fez toda boca silenciar e todo olhar enrijecer. Nesse meio-tempo o equilibrista começara seu trabalho: surgira de uma pequena porta e andava sobre a corda que se achava estendida entre duas torres, acima da praça e do povo.14 Quando estava no meio de seu caminho, abriu-se novamente a pequena porta e um rapaz de vestes coloridas, semelhante a um palhaço, pulou fora e seguiu o primeiro com passos rápidos. “Adiante, aleijado!”, gritou com voz terrível, “adiante, preguiçoso, muambeiro, cara-pálida! Para eu não te fazer cócegas com meu calcanhar! Que fazes aqui entre as torres? Teu lugar é na torre, devias ser trancafiado, estorvas o caminho de alguém melhor do que tu!” — E a cada palavra lhe chegava mais próximo; porém, quando estava a somente um passo do equilibrista, sucedeu a coisa pavorosa que fez toda boca silenciar e todo olhar enrijecer: — lançou um grito de demônio e saltou sobre aquele que lhe estava no caminho. Mas esse, vendo seu rival assim triunfar, perdeu a cabeça e a corda; desfez-se de sua vara e mais rapidamente do que ela mergulhou na profundeza, como um redemoinho de braços e pernas. 

A praça e o povo semelhavam o mar quando chega a tempestade: todos corriam e se atropelavam, sobretudo no local onde se precipitava o corpo. Zaratustra ficou imóvel, porém, e justamente ao seu lado caiu o corpo, bastante ferido e quebrado, mas ainda vivo. Após um instante, a consciência retornou ao homem destroçado, e ele viu Zaratustra ajoelhado junto a si.

“Que fazes aqui?”, disse ele afinal, “há muito tempo eu sabia que o demônio me passaria a perna. Agora ele me leva para o inferno; queres impedi-lo?”

“Por minha honra, amigo”, respondeu Zaratustra, “nada do que falas existe: não existe demônio nem inferno. Tua alma morrerá antes ainda que teu corpo: nada temas, portanto!” 

 O homem ergueu os olhos, desconfiado. 

“Se falas a verdade, então nada perco, ao perder a vida. Não sou muito mais que um animal a que ensinaram a dançar, com golpes de bastão e pequenos nacos de comida.”
 

“De maneira nenhuma”, disse Zaratustra; “fizeste do perigo o teu ofício, não há o que desprezar nisso. 

Agora pereces no teu ofício: por causa disso, eu te sepultarei com minhas próprias mãos.”
 

Depois que Zaratustra falou isso, o moribundo não respondeu mais; mas moveu a mão, como se buscasse a mão de Zaratustra para agradecer. Nesse meio-tempo caiu a noite, e a praça se ocultou na escuridão: então a gente se dispersou, pois mesmo a curiosidade e o espanto se afadigam" [...]  (Livro: Assim Falou Zaratustra/Nietzsche)

Sombra e Luz

[...] "Sombra e luz, escuridão e claridade. Essa realidade dupla forma o interior do ser humano, que tenta negar-se a cada dia, enganando-se. A maioria das pessoas quer ser apenas luz. Recusam-se a identificar a sombra que faz parte delas. Religiosos de um modo geral falam de um lado sombrio, diabólico, umbralino, como se esse lado escuro fosse algo externo, ruim, execrável. Até quando negar a realidade íntima? Até quando adiar o conhecimento do mundo interno? Várias tentativas foram realizadas para conscientizar o homem terreno de que as chamadas trevas exteriores são apenas o reflexo do que existe dentro dele. Luz e sombra são aspectos internos do ser e não representam necessariamente um lado ruim e outro bom. A sombra não é pior do que a luz. Apenas faz parte de um equilíbrio universal ainda necessário para a visão do homem terrestre. São dois polos de uma verdade interna, mais profunda". [...] (Livro: Legião, de Robson Pinheiro/Ângelo Inácio)

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